Na política, a expressão “lua
de mel” caracteriza o período imediatamente após a eleição de um governante,
momento em que as expectativas do eleitorado, mesmo da fatia que não votou no
eleito, focam-se no desejo de que o governo dê certo, pois isso viria em benefício
de todos. Assim, o eleito ganha um “crédito” para tomar as medidas sem ser
cobrado por resultados imediatos, permanecendo um tempo em “estado de
observação”.
A duração desse clima varia
conforme a capacidade de o governante acertar, produzindo resultados positivos
que correspondam à expectativa gerada. Se errar encurta ou interrompe a lua de
mel e começa a sofrer adversidades políticas. No caso de Temer, fatais. Daí o
título: Lua de Mel de Motel.
As circunstâncias que limitam
de forma extrema a latitude e o tempo de Temer para agir sem espaço para errar
são de natureza política e econômica.
Do ponto de vista político é
inescapável constatar que o PMDB é sócio do desastre produzido pelo PT. Além
disso, Temer, vice de Dilma, tem o nome citado em delações da lava jato e herda
significativas desconfianças. Inevitável desconhecer, também, o processo que
tramita no TSE contra a chapa Dilma/Temer, que, se prosperar, terá o poder de
abreviar seu já breve mandato. Pobre Brasil.
Convém ter em conta que boa
parte das medidas necessárias para correção estrutural da economia têm
potencial de municiar a oposição de esquerda recém desalojado do governo, com
um discurso e com um poder de mobilização que, se não forem neutralizados,
liquidam Temer na largada.
Do ponto de vista econômico as
dificuldades não são menores. Segundo o especialista em contas públicas,
Mansueto Almeida no Painel Globonews desse fim de semana, nosso rombo fiscal é
de R$ 120 bilhões sem considerar-se os juros da dívida, e de R$ 640 bilhões se
incluído esse custo. Para ele, será necessário reduzir o custo da dívida em
cerca de R$ 250 bilhões em cerca de dois anos e meio para voltarmos a ter sustentabilidade.
Nessa conta, não estão
incluídos os aportes de capital do Tesouro nas estatais. No caso da Petrobrás o
aporte poderá girar acima de R$ 70 bilhões, sem considerar o impacto das
condenações da petrolífera na Justiça dos EUA, estimados em US$ 98 bilhões a
serem desembolsados em cerca de dois anos. Há rombos ainda não estimados na
Eletrobrás, na CEF, no BB e no BNDES, que somente serão conhecidos após auditoria
que Temer vem anunciando.
Mansueto Almeida sustenta que
não vê como inverter esses números apenas cortando gastos e sem aumentar a
carga tributária. Eduardo Gianetti alegou que não temos fôlego para mais
impostos. Zeina Latif contestou Mansueto. Ela acha que se Temer conseguir criar
expectativas positivas invertendo a direção do vento na largada, cria-se um
cenário de curto prazo capaz de ampliar a latitude de jogo e dilatar o espaço
de tempo que Temer teria para sua lua de mel com o eleitorado. Concordo. Essa
equação é política, portanto. Sem sintonia fina com a opinião pública e o
mercado nada dará certo. A condução que Temer está dando ao processo revela que
ele tem consciência disso e condições de acertar.
A primeira decisão a tomar é
com relação à equação do ajuste, com ou sem aumento de impostos. Mansueto alega
que mesmo com aumento, se conseguirmos reequilibrar as contas, chegaremos em
2018 no patamar em que estávamos em 2011. Bem, a pergunta que não lhe foi feita
é: dada a asfixia fiscal atual dos pagadores de impostos e conhecido o impacto
da chamada curva de Laffer, extorquir ainda mais os produtores de riqueza
aumentará a arrecadação? Intuo que o resultado será o inverso.
Não sou economista, mas,
acrescento que um eventual aumento de impostos também tirará de Temer apoios
imprescindíveis (da classe média que foi às ruas e da FIESP, por exemplo), já
na largada. Se eu fosse conselheiro do rei, diria: não faça! Sua credibilidade
e seu apoio popular atuais não comportariam essa perda imediata, cujos ganhos de
médio prazo são, no mínimo, duvidosos.
Onde há oxigênio? Na atração
de capitais externos. Exceto pelo petismo, que não conta, parece haver consenso
sobre essa alternativa: privatizar e flexibilizar os marcos regulatórios tornando as concessões
de portos, aeroportos, estradas, ferrovias, energia, exploração de petróleo e
tudo o que puder atrair investidores de forma agressiva. Em sentido oposto às concessões
tardias e fracassadas de Dilma, é preciso acenar com rentabilidade e segurança
jurídica aos investidores, mesmo que o Brasil esteja barato.
O caso do petróleo é
emblemático dado o prazo de validade dessa matriz na economia mundial e a queda
do preço que tornou os investimentos menos interessantes. Além de desfazer o
que o PT fez no pré-sal, talvez seja necessário flexibilizar mais, até mesmo o
marco regulatório tucano para as demais áreas de exploração, tornando o
investimento atraente ao pondo de interessar potenciais investidores que já perdemos
para outros competidores (México, por exemplo).
O agronegócio, maltratado pelo
petismo, é outro setor que demanda um carinho especial e que, pela
competitividade combinada ao real desvalorizado, se incentivado com medidas
corretas, pode atrair divisas com rapidez.
Medidas como essas, mesmo que
anunciadas e implementadas em curtíssimo prazo, requerem algum tempo para
produzir efeitos, ainda que na frente externa já estejamos colhendo os frutos
da desvalorização do real. Mais uma vez, o que se espera desse tipo de medida
não é o resultado econômico imediato, mas sim a reversão de expectativas
visando reconstituir o otimismo.
Conviria a Temer fazer
acompanhar essas medidas de máxima publicidade às descobertas que virão à tona
sobre o descalabro da gestão pública sob desmando petista. O objetivo aqui
seria mais o rebaixamento de expectativas visando ampliar o crédito para
aceitação de medidas incontornáveis como corte de gastos. A virtual sensação de
alívio posterior, ainda que psicológica, seria mais facilmente sentida pela
população quando o resultado positivo começar a acontecer, tanto mais quanto
mais grave for percebida, agora, a herança maldita do PT.
Supondo-se o sucesso inicial
na direção aqui apontada e tirado o paciente da UTI para a sala de recuperação,
haveria condições para avançar medidas estruturais incontornáveis como a
Reforma da Previdência? No curto prazo? Nem pensar! Se não vejo como aumentar
impostos sem atrair a ira das ruas, muito menos mexer nas aposentadorias. Nesse
terreno, o máximo que dá para fazer é aprofundar o debate sobre a gravidade da
situação, preparando o terreno para medidas futuras. Não esqueçamos que Temer
já é acusado de querer cortar os gastos sociais que Dilma está cortando. Esse
ônus já está precificado e é inescapável.
Onde antevejo margem para
alguma alteração estrutural capaz de ser assimilada sem maiores resistências e
com potencial sobre a geração de empregos é na medida que prevê a sobreposição à
Lei dos acordos trabalhistas entre empregados em empregadores, trocando preservação
ou geração de empregos por redução de custos de contratação e demissão. A
Justiça Trabalhista (absurdo!), tem anulado esse tipo de acordo alegando
desrespeito à legislação. Dado o cenário de recessão e desemprego, há espaço
para avanços nessa área, sem que o debate se perca na chicana das desonerações
seletivas implementadas pelo PT e anuladas pela própria ineficácia e obtusidade
da ótica econômica petista.
Assim, passo a passo, testando
cada possibilidade antes de agir, medindo no milímetro o eventual avanço e o
microcrédito político conquistado junto à opinião pública e o mercado no curtíssimo
prazo, Temer poderia ir criando as condições para algumas ousadias moderadas à
medida em que, se acertar mão, o povo for lhe concedendo a possibilidade de
curtir mais algumas noites no motel. O povo, em seu próprio benefício, deseja
que Temer acerte. O Brasil precisa que Temer acerte.
Assim agindo fecharemos as
contas das planilhas de Mansueto Almeida? Não sei. Mas, a Economia e a Política
são ciências do comportamento. E, para fechar as contas nessa matemática
política, impõe-se criar um ambiente favorável para que os especialistas em
planilhas trabalhem em condições de conduzir os números ao devido lugar.