Quem
é o líder? Qual é o partido? Quem está por trás? O que querem? Com quem
negociar? Perguntas como essas atormentaram jornalistas e políticos perplexos
com as manifestações de junho de 2013 no Brasil. Como explicar o que acontecia?
Que indicadores teriam mais centralidade para entender as causas do fenômeno?
Se
puséssemos todas as reivindicações dos manifestantes num liquidificador
imaginário, e, em seguida, filtrássemos as demandas, talvez a síntese se
resumisse ao fim da corrupção e à demanda por serviços públicos “padrão FIFA”. Mas,
a corrupção e a péssima qualidade dos serviços públicos estão aí há décadas e
nem por isso as massas explodiram. O que mais poderia explicar a adesão da sociedade
às manifestações?
Os
gastos públicos com os estádios da Copa parecem um ingrediente incontestável,
já que o povo pede “padrão FIFA” nos serviços públicos. Também não parece
possível descartar as perdas provocadas pela volta da inflação como espoleta
para a explosão das massas.
Haveria
mais alguma causa a considerar? Talvez a consciência da população,
especialmente da classe média, sobre a alta carga tributária brasileira.
A
Associação da Classe Média, de Porto Alegre, com apoio do Instituto Liberdade, foi
pioneira na luta pela consciência tributária no Brasil. Foi pelas mãos da
ACLAME que se iniciou, no RS, o movimento, hoje nacional, conhecido como “Dia
da Liberdade de Impostos”. Em seguida, somou-se o IBPT (Instituto Brasileiro de
Planejamento Tributário). Depois veio a Associação Comercial de São Paulo com o
Impostômetro, dentre outras inciativas que ganharam apoio do noticiário a
adesão da sociedade.
Em
2005 a ACLAME fez uma pesquisa em várias capitais brasileiras, aferindo o grau
de consciência tributária da população. Surpreendia, à época, o desconhecimento
da sociedade quanto à alta incidência de impostos sobre o consumo. Segmentos expressivos
da classe média com acesso à educação, revelavam, naquela pesquisa, desconhecer
que se paga algo entre 35% e 55% de impostos sobre produtos e serviços consumidos
no Brasil. Impostos, para os entrevistados, eram apenas o IRPF, o IPVA e o
IPTU. Hoje a imensa maioria da população sabe que paga muitos impostos e que os
governos gastam mal nosso dinheiro.
Vitória
contabilizada; cabe a reflexão: isto basta?
Há
dimensões ocultas, paradoxais até, implícitas ao movimento de massas que foi às
ruas em junho de 2013. Por um lado, constata-se um conteúdo libertário
extremamente interessante nesses movimentos. Por outro, uma demanda nebulosa
que pede mais Estado onde, por coerência, deveria pedir menos Estado e mais
governo.
Antes
da chegada do PT ao poder, era esse partido e os sindicatos, movimentos e ONGs
que controla quem servia de porta-voz das demandas da sociedade, em geral,
traduzidas em pautas econômicas dirigidas aos governos.
Chegando
ao poder o PT estatizou esses movimentos e organizações, seja cooptando suas
lideranças com cargos no Estado, seja comprando seu apoio com a farta distribuição
de dinheiro público. A ascensão social dos novos ricos petistas incrustados na
máquina pública e a overdose de marketing governamental entorpeceram a mídia e
o governismo com a droga da prosperidade - real para os apaniguados do Estado; ilusória
para a classe média que paga a conta. Excluída das “bolsas estatais” distribuídas
para os de baixo e os de cima da pirâmide social, a classe “do meio”, indignada,
foi às ruas.
A
internet proporcionou à sociedade libertar-se do jugo dos aparelhos paraestatais
de controle social (partidos, sindicatos, ONGs). Através das mídias sociais da
era digital, redes de cidadãos autônomos se articularam e saíram do mundo
virtual para as ruas surpreendendo líderes e organizações da era analógica.
Até
que ponto esse grito de liberdade vai se confirmar como cidadania independente
do Estado, algo inédito na história patrimonialista brasileira, é uma incógnita
que só o tempo responderá. Para que a formação de uma sociedade civil autônoma
e independente do Estado se converta em realidade no Brasil, no entanto, muito será
preciso avançar. Apesar dessa forma libertária de manifestação que as jornadas
de junho apresentaram, o conteúdo das reivindicações se apresenta contraditório.
As formas de ação e organização se libertaram. E as mentalidades?
Se,
por um lado, essa classe média revela consciência tributária, revela também,
por outro, carência de consciência fiscal. Supor que “passe livre” no
transporte público é sinônimo de transporte gratuito é de uma ignorância atroz.
Supor que o Maracanã estatizado custará menos ao contribuinte do que se gerido
pela iniciativa privada é uma ilusão para a qual contribuiu a forma nebulosa
como se deu a concessão do estádio para o consórcio de Eike Batista. Supor que
rodovias estatais sem pedágio terão melhor qualidade e investimentos adequados do
que se forem privadas e pedagiadas é de uma ingenuidade infantil.
Há
promiscuidade entre concessionárias-empreiteiras e políticos. Obras públicas e
pedágios podem custar menos se comissões para políticos corruptos e orçamentos
de campanha eleitoral forem retiradas do preço pago pelo consumidor/contribuinte.
As agências reguladoras precisam ser apartidárias e autônomas; órgãos cuja
função é proteger a sociedade da ganância de empreiteiros e políticos.
Mas,
esse povo que acredita em almoço grátis não faz essa conta e, tal como os economistas
do governo, crê que os cofres públicos são fábricas de riqueza ilimitada.
Esclarecer
o povo sobre os impostos que paga sobre tudo que consome levou cerca de uma
década e foi tarefa relativamente simples.
Estará
esse povo, deitado sobre o berço esplêndido do patrimonialismo brasileiro, disposto
a viver livre da escravidão estatal?
Esses
políticos que aí estão são capazes de corresponder a essa demanda ou precisamos
de novos líderes e novos partidos?
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