A expressão “não nos
representa” ganhou espaço nas redes sociais no período que antecedeu as
jornadas de junho. Sua vítima mais ilustre foi o deputado Marco Feliciano,
atacado pela comunidade GLTB e seus simpatizantes por causa de seu projeto
sobre a “cura gay”. Foi usada também em outras situações, sempre com a intenção
de afirmar que o político ou partido “x” ou “y” não representam as posições e
interesses da minoria “a” ou “b”. Certamente essas minorias têm quem as
represente no sistema partidário e ideológico do país. Alguém não tem?
Acabamos de assistir a
autorização da Justiça Eleitoral para o funcionamento da trigésima primeira e da
trigésima segunda legendas partidárias no Brasil e a não autorização da
trigésima terceira, que, embora não possa lançar candidaturas em 2014, será
autorizada para o pleito seguinte assim que obedecer aos requisitos legais.
A lei foi cumprida nesses
três casos. Mas, em meio às críticas pela profusão de siglas no Brasil é
curioso observar que o arcabouço legal existente amparou a criação de mais duas
agremiações fisiológicas (PROS e Solidariedade) e barrou a criação de uma
legenda com nítido viés ideológico, legítima liderança política de projeção
nacional e efetiva representação de um segmento expressivo da sociedade (Rede
Sustentabilidade). Há algo de errado aqui.
O que está errado no nosso
sistema político não é a profusão de siglas, mas sim, o fato de que a criação
de partidos permite a seus proponentes acesso a montanhas de cargos na máquina
do Estado, dinheiro público e tempo de mídia no horário eleitoral gratuito. É
isto que dá aos criadores de partidos de negócios o poder de barganha que lhes
possibilita vender apoio aos governos e grandes partidos em troca de mais
acesso a cargos e dinheiro público. Se essa prática fosse crime Marina Silva
não seria condenada. Por outro lado, centenas, talvez milhares, de políticos
que só representam a si mesmos teriam que ir para trás das grades.
Os partidos políticos brasileiros
são organizações paraestatais. E, se considerarmos que os sindicatos no Brasil
são órgãos de Estado, nem o PT, supostamente nascido “de baixo para cima”
escapou disso. Chegando ao governo o PT perdeu totalmente a estrutura de
núcleos de base de sua origem. Tornou-se mais um “partido de cargos públicos”.
Vou simplificar e correr o
risco de afirmar que existem hoje, no mundo ocidental, dois grandes campos
político-ideológicos que disputam o poder na maioria das democracias. E uma
terceira força que emerge ainda sem contornos doutrinários claros.
À direita e à esquerda, sim,
elas existem, vemos liberais e socialdemocratas. Sinteticamente diferenciam-se
pela defesa da ingerência ou não do Estado na vida e nos negócios dos
indivíduos. Em ambos os campos há seus matizes. Os polos extremos são os
anarcocapitalista à direita e os jurássicos comunistas à esquerda. A terceira
força é o ecologismo político.
Na rede dos Verdes há muitos
ativistas e poucos formuladores capazes de definir o que seriam seus contornos
doutrinários e ideológicos. Mas, é inegável que os Verdes são uma corrente
política legítima, emergente e com expressiva representatividade em vários
países do mundo. No caso brasileiro os Verdes são predominantemente de esquerda
e não escondem a ambição pelo exercício do poder. Os marineiros não conseguiram
legalizar um partido, mas querem governar o país. A Rede de Marina nasceu de
uma costela do PT, embora tenha flertado com economistas liberais na formulação
de sua plataforma de governo de 2010 e conviva com uma colorida fauna
militante, inclusive, dizem, com gente com interesses qualidades morais
duvidosas.
Há verdes de direita, há
verdes de esquerda e há verdes que não são de direita e nem de esquerda, muito
antes pelo contrário. Ainda não nasceram nem o Marx e nem o Adam Smith dos
verdes. Adam Smith foi um defensor do liberalismo econômico. Marx, seu crítico,
autor de O Capital, incursionou também pelo terreno da “teoria” política.
Embora tenham nascido da crítica
econômica de Marx ao capitalismo, os comunistas sempre privilegiaram mais o
pensamento político do que o econômico. Prova disso é que após o colapso da
URSS nada surgiu de novo e relevante no campo do pensamento econômico de
esquerda. Os fundamentos do pensamento econômico socialista seguem amparados na
crítica ao capitalismo do século XIX e na resposta de Keynes às crises cíclicas
do capitalismo. O que segue vivo no quadrante da esquerda é a ambição pelo
poder.
O liberalismo pariu pensadores brilhantes.
Seus fundamentos se alicerçam em um conjunto de ideias morais, políticas e
econômicas. No entanto, os liberais contemporâneos teimam em reduzir o escopo
de sua luta política ao debate econômico em defesa das ideias da Escola
Austríaca e da Escola de Chicago como contrapontos às ideias de Marx e Keynes. No
Brasil, os poucos liberais existentes fogem (ou fugiam?), como o diabo da cruz,
da luta política no terreno partidário. Recusam-se a aprender a lição que Lula
aprendeu quando criou o PT: é no exercício do poder que se definem os rumos do
mundo e das nações.
A consequência mais evidente
desse erro é a aceitação passiva de um sistema político aleijado no qual não
existe a direita autêntica. Todos os partidos brasileiros são organizações
patrimonialistas, defensoras de mais ingerência do Estado na vida do cidadão.
Os brasileiros desconhecem o que é a Liberdade. Em 2014, assim como foi em
2010, todos os principais candidatos à Presidência da República serão de
esquerda.
Ao leitor atento não terá
escapado a percepção de que há uma interrogação plantada entre parêntesis dois
parágrafos acima. Sim, estão em gestação pelo menos duas legendas liberais
autênticas no Brasil. Trata-se do Partido Novo e do Partido Federalista.
Voltarei a essa análise numa próxima oportunidade.